Artigo escrito por:
Oscar Valente Cardoso
Adir José da Silva Junior
O direito - ou não - dos vigilantes ao reconhecimento da especialidade de seu trabalho, para a obtenção de aposentadoria especial (ou para, até 13/11/2019, converter o tempo especial em comum, para ser utilizado na concessão de aposentadoria por tempo de contribuição antes da vigência da Reforma da Previdência realizada pela Emenda Constitucional 103/2019) é uma questão polêmica há muitos anos.
Considerando que, administrativamente não era sequer reconhecido o enquadramento da atividade, o Judiciário reconheceu que o trabalho de vigilante é considerado especial até 28/04/1995, mediante prova do desempenho da função (anotação na CTPS, contrato de trabalho, formulário preenchido pelo empregador, entre outras), por ser equiparada às funções de guarda.
Nesse sentido é a Súmula nº 26 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU): “A atividade de vigilante enquadra-se como especial, equiparando-se à de guarda, elencada no item 2.5.7. do Anexo III do Decreto n. 53.831/64”.
Assim, até 28/04/1995, a atividade de vigilante é considerada especial, ou seja, basta a prova de seu exercício para o enquadramento da especialidade.
Contudo, permaneceu controversa a possibilidade – ou não – do reconhecimento da especialidade da atividade de vigilante a partir de 29/04/1995 e, em caso positivo, como comprovar a efetiva exposição a agentes nocivos de forma habitual e permanente (e, consequentemente, se a potencial periculosidade da atividade é suficiente para esse fim).
O INSS deixou de considerá-la como sendo uma atividade especial a partir de 29/04/1995 (data de entrada em vigor da Lei nº 9.032/95, que alterou o § 3º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, para exigir a prova de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física), o que gerou milhares de processos judiciais sobre o assunto (pelos segurados que pretendiam o reconhecimento da especialidade) e duas divergências relevantes no Judiciário:
- a possibilidade (ou não) de enquadramento como atividade especial com fundamento na periculosidade da atividade de vigilante;
- e a necessidade - ou não - do porte de arma de fogo no trabalho para a caracterização da periculosidade.
Sobre o assunto, o Tema Representativo nº 128 da TNU admite em tese o enquadramento da especialidade, desde que o trabalho seja prestado com o porte de arma de fogo e a nocividade seja comprovada por meio de laudo técnico (a partir de 06/03/1997):
“É possível o reconhecimento de tempo especial prestado com exposição ao agente nocivo periculosidade, na atividade de vigilante, em data posterior à vigência do Decreto n. 2.172/92, de 05/03/1997, desde que laudo técnico (ou elemento material equivalente) comprove a permanente exposição à atividade nociva, com o uso de arma de fogo”.
No dia 9 de dezembro de 2020, o Superior Tribunal de Justiça concluiu o julgamento do Tema nº 1.031 dos Recursos Repetitivos, com a definição da seguinte tese:
"É admissível o reconhecimento da especialidade da atividade de vigilante, com ou sem arma de fogo, em data posterior à lei 9.032/1995 e ao Decreto 2.172/1997, desde que haja comprovação da efetiva nocividade da atividade por qualquer meio de prova até 5 de março de 1997 e, após essa data, mediante apresentação de laudo técnico ou elemento material equivalente para comprovar a permanente e não ocasional nem intermitente exposição a agente nocivo que coloque em risco a integridade física do segurado".
O julgamento do Tema nº 1.031 do STJ levou a três regras principais:
(a) em tese, a atividade de vigilante pode ser enquadrada como especial para fins previdenciários após 29/04/1995, independentemente do porte de arma de fogo;
(b) a demonstração da especialidade da atividade é condicionada à prova de exposição permanente (não ocasional e nem intermitente) a agente nocivo que coloque em risco a integridade física do segurado;
(c) e essa caracterização da especialidade depende da apresentação da prova adequada, que pode ser por qualquer meio de prova, de 29/04/1995 a 05/03/1997, e por meio de laudo técnico ou do PPP elaborado pelo empregador a partir de 06/03/1997.
Trata-se de um precedente vinculante, que deve ser observado em todos os processos previdenciários judiciais e administrativos sobre a mesma questão.
Isso não significa que há um reconhecimento automático da especialidade da atividade de vigilante, independentemente do uso de arma de fogo e do período trabalhado, mas sim que o enquadramento como atividade especial depende da observância dos critérios normativos previstos no Tema nº 1.031 do STJ e nas regras pertinentes da Lei nº 8.213/91 e do Decreto nº 3.048/99.
Contudo, o precedente do STJ não resolveu uma questão relevante (surgida após a afetação dos recursos ao Tema nº 1.031) que diz respeito à possibilidade – ou não – do reconhecimento da especialidade com fundamento na periculosidade a partir de 13/11/2019. Desde essa data, o art. 201, § 1º, II, da Constituição, alterado pela EC 103/2019, permite o enquadramento como especial das atividades desempenhadas “(...) com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação”.
Apesar de não ter sido aprovado o texto original da PEC 06/2019, que proibia expressamente o enquadramento da atividade especial com base na periculosidade, o texto final aprovado em tese não reconhece as atividades perigosas como especiais.
Por isso, ainda deve haver outra definição geral (que afetará os vigilantes, os eletricistas e outros profissionais) no Judiciário, sobre o direito – ou não – de aposentadoria especial para quem exerce atividade em situações perigosas após 13/11/2019.
Artigo também publicado no Jusbrasil (clique aqui) e no Jus Navigandi (clique aqui).
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